A possibilidade de aplicação de medidas atípicas nos processos executivos, como apreensão de CNH e passaporte, entre outras, visando maior celeridade e efetividade no cumprimento das ordens judiciais, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária, foi uma inovação do Código de Processo Civil/15.
Em vista disso, os magistrados passaram a deferir ordens contra os devedores para apreensão de Carteira Nacional de Habilitação e do passaporte e a proibição de participação em concursos e licitações públicas, a fim de assegurar o cumprimento das ordens judiciais e, consequentemente, obter a satisfação do crédito.
Não é raro que credores enfrentem dificuldades para conseguir receber oque lhes é devido, em razão da ausência de localização de bens do devedor, os quais muitas vezes ostentam em suas redes sociais condições de vida incompatíveis com a situação, inclusive, demonstrando indícios de ocultação de patrimônio para frustrar a execução.
No entanto, apesar de os artigos 139, inciso IV, 297, 380, parágrafo único, 403, parágrafo único, 536, caput e § 1º, e 773 do Código de Processo Civil/15 possibilitarem a adoção de saídas mais efetivas pelos magistrados para impedir que devedores utilizem meios de blindagem patrimonial e dificultar o cumprimento das ordens judiciais, tais medidas geraram grande controvérsia no Poder Judiciário, no tocante ao alcance dos atos executivos atípicos.
Nesse sentido, em maio de 2018, o Partido dos Trabalhadores ajuizou no Supremo Tribunal Federal a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5941,alegando que tais dispositivos abriram margem para interpretações extremas, que poderiam violar o direito de ir e vir dos devedores, garantido constitucionalmente.
A Procuradoria Geral da República apresentou parecer, opinando pela inconstitucionalidade parcial, pontuando que devem ser permitidas, em caráter subsidiário, apenas as medidas atípicas de caráter estritamente patrimonial, ficando, assim, excluídas as que importem em restrição às liberdades individuais, como é o caso das medidas ora apontadas.
O Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou sobre o assunto, tendo a 3ªTurma reafirmado, em julgamento recente, a possibilidade de suspensão da Carteira Nacional de Habilitação ou do passaporte do devedor desde que haja indícios de que ele possua patrimônio expropriável. De todo modo, tais medidas só devem ser adotadas de modo subsidiário, por meio de decisão fundamentada e adequada às especificidades do caso concreto, sem prejuízo do contraditório e da adequada proporcionalidade da medida.
Espera-se, no entanto, a redesignação do julgamento da referida ADI, cujo início estava previsto para 28/10/2020, o que não ocorreu.
Por certo, a decisão do STF sobre o assunto impactará significativamente nas ações de recuperação de créditos, pois definirá o padrão de força que credores de toda a espécie terão no exercício da busca da satisfação de seus créditos.
Marília Garcia , advogada especialista em contencioso cível estratégico.