Inicialmente, vale destaque para o fato de que o design de produtos é abrangido pelo que se define como propriedade industrial.
A propriedade industrial corresponde à modalidade de proteção concedida à “bens integrantes da propriedade industrial: a invenção, o modelo de utilidade, o desenho industrial e a marca.”1
Novamente nas palavras de Fábio Ulhoa Coelho, o desenho industrial nada mais é que:
“O desenho industrial (design) é a alteração da forma dos objetos. Está definido, na lei, como ‘a forma plástica ornamental de um objeto ou o conjunto ornamental de linhas e cores que possa ser aplicado a um produto, proporcionando resultado visual novo e original na sua configuração externa e que possa servir de tipo de fabricação industrial’ (LPI, art. 95).”2
O design, por sua vez, pode ser considerado como sendo desenho industrial, correspondendo a forma e aparência física do produto em questão, bem como a elementos visuais definidores do produto no mercado de consumo.
Referida definição do que se considera como desenho industrial e consequentemente quais as proteções que lhes são conferidas são postas na lei de propriedade industrial.
A proteção ao desenho industrial, nos termos do art. 96 da mesma lei de Propriedade Industrial, se dá por meio do registro do objeto no INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial). Por meio de referido registro o desenho industrial, ou seja, o design específico de determinado produto, se torna propriedade do depositante, aquele em nome de quem referido desenho foi registrado.
É evidente que para que haja a proteção ao design de determinado produto é necessário que se cumpram alguns requisitos.
Vale ressaltar trecho da Enciclopédia Jurídica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) sobre os requisitos para a proteção do desenho industrial:
Para merecer proteção também é necessário que o desenho industrial seja original. Segundo o art. 97 da Lei 9.279/1996, “o desenho industrial é considerado original quando dele resulte uma configuração visual distintiva, em relação a outros objetos anteriores”. Seu parágrafo único esclarece que “o resultado visual original poderá ser decorrente da combinação de elementos conhecidos”.3
Ora, destaca-se que apenas os designs considerados como sendo originais serão protegidos como desenho industrial.
Ademais, em caso de inexistência de registro do desenho industrial permite a fabricação e comércio de produtos com características técnicas ou ornamentais que não sejam objeto de registro de exclusividade alheia. Com efeito, a mera cópia de um desenho industrial já previamente utilizado por outrem (mas desprovido de registro) não é necessariamente um ato ilícito, quando as respectivas marcas forem suficientes para distingui-los.
Esta discussão foi levada à mais alta corte dos Estados Unidos, no caso julgamento do caso Sears v. Compco que dizia respeito à utilização de formas ornamentais não protegidas.4
Entretanto, a utilização de desenho industrial alheio, ainda que não registrado, é regulada por normas concorrenciais.
Caso o design de referido produto, ou seja, o desenho industrial, tenha adquirido secondary meaning, tornando-se elemento distintivo do produto de referido fabricante em relação aos seus concorrentes, a reprodução ou imitação de referido design será considerada como sendo um ato de concorrência desleal.
Portanto, é evidente que em casos de design original e particular de produto, em especial em casos nos quais seja verificado o registro do desenho industrial no INPI, sua reprodução ou cópia por concorrente se torna inviável, sendo defesa em lei.
A violação ao direito concorrencial, ou seja, a concorrência desleal, destarte, reside na cópia ou reprodução não autorizada de desenho industrial com registro no INPI ou que configure design com secondary meaning, ou seja, com ornamentação específica de determinada empresa, que seja absolutamente distinta de seus concorrentes e seja utilizada como identidade visual de referido produto, distinguindo-o, aos olhos do consumidor, dos produtos concorrentes.
A reprodução de desenho industrial, registrado ou não no INPI, será considerada como sendo ato de concorrência desleal mediante a análise da chamada “tendência de mercado”.
O conceito de “tendência de mercado” nada mais é do que a análise da frequência de utilização de referido design por diversas fabricantes do mesmo produto. Ou seja, se analisa quão propagado e comum o uso de referido design ou ornamentação de produto se tornou em determinado setor do mercado.
Neste mesmo sentido, em consonância com o precedente da Suprema Corte dos Estados Unidos, já mencionado anteriormente (Sears v. Compco), os tribunais brasileiros em realizando referida análise sobre o secondary meaning e a tendência de mercado, tanto em casos de desenho industrial registrado no INPI quanto em casos daqueles que não foram registrados.
A concorrência desleal, nesse sentido, é considerada pelos tribunais quando se verifica a clara inexistência de tendência de mercado para determinado design.
Deste modo, a reprodução de desenho industrial que seja específico de determinado concorrente configura violação à proteção conferida a referido design, sendo considerada, portanto, ato de concorrência desleal.
Destaca-se novamente que mesmo inexistente o registro no INPI, referido design possui proteção ao desenho industrial, sendo possível a identificação de concorrência desleal:
Mesmo as marcas desprovidas de qualquer depósito ou registro são protegidas pelas normas que reprimem a concorrência desleal. A reprodução ou imitação da marca já explorada por um concorrente, ainda que não registrada, configura emprego de meio fraudulento para desviar em proveito próprio a clientela de outrem.5
Por outro lado, verifica-se que em casos nos quais não se identifica a originalidade ou novidade do desenho industrial, ou seja, quando referido desenho industrial se torna “tendência de mercado”, ainda que haja registro no INPI, a sua reprodução não será considerada como sendo ato de concorrência desleal.
Deste modo, a decisão judicial acerca da concorrência desleal depende da verificação dos elementos de originalidade, novidade e eventualmente da tendência de mercado.
Sendo um design, registrado ou não, original e passível de ser configurado como “novidade”, a reprodução do trade dress ou do desenho industrial será considerada como concorrência desleal. Por outro lado, sendo o design uma tendência de mercado, reproduzido por mais de um concorrente e sendo característica geral do produto em questão independente do fabricante, será descartada a concorrência desleal.
Tomemos como exemplo para melhor identificação das diferenças do que exatamente é “tendência de mercado”, o desenvolvimento de smartphones.
Um grande exemplo de referido conceito é a existência do botão “iniciar” no display frontal de aparelhos smartphones. Referido botão surgiu inicialmente nos aparelhos produzidos pela empresa Apple, sendo inicialmente uma característica distintiva de referidos aparelhos, possuindo, portanto, secondary meaning.
Com o passar do tempo referido botão tornou-se sinônimo de quaisquer aparelhos smartphones adquiridos no mercado de consumo, tendo sido reproduzido de modo similar por diversas empresas concorrentes.
Com isso, a existência de referido botão no display frontal tomou a forma de tendência de mercado, garantindo a possibilidade de reprodução similar por parte de concorrentes sem que se configurasse qualquer prática de concorrência desleal.
Destaca-se que a reprodução de design que seja tendência de mercado, ainda assim, pode ser feita apenas de modo similar, não podendo ser uma reprodução exata do design em questão.
Neste sentido, em caso de cópia exata ou então de desrespeito à proteção conferida à desenho industrial, é possível a responsabilização das empresas envolvidas na cadeia de produção ou venda de referidos produtos.
De modo geral, em casos envolvendo alegações de concorrência desleal, a parte demandada e, consequentemente, considerada como responsável, é a fabricante do produto que realiza a reprodução do trade dress ou do desenho industrial.
Deste modo há uma tendência maior à responsabilização da fabricante, que tende a ser a concorrente direta da empresa afetada. Contudo, tendo em vista a cadeia de consumo, existe a possibilidade de responsabilização por parte da empresa distribuidora.
A responsabilização solidária por parte das distribuidoras se dá em razão da exploração econômica dos lucros obtidos pela venda e distribuição dos produtos que possuam design similar ou reproduzido de desenho industrial alheio.
Em suma, a análise da existência ou não de ato de concorrência desleal em reprodução de design de produto passa, essencialmente, pela análise da configuração ou não de tendência de mercado de determinado aspecto de design, passando ainda pela verificação do grau de similaridade da reprodução que, para que não seja considerada tendência de mercado, deve ser apenas similar e não idêntica ao produto concorrente.
1 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial V. 1. 21ª ed. Editora Revista dos Tribunais.
2 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial V. 1. 21ª ed. Editora Revista dos Tribunais.
3 Desenho industrial (pucsp.br)
4 LADAS, Stephen P. Patents, trademarks and related rights: national and international protection, pp. 1710-1712.
5 SCHMIDT, Lélio Danicoli. A Proteção das Marcas no Brasil in Tratado de Direito Comercial V. 6. Ed. Saraiva, 2015, pp. 257.
Felipe Badari, advogado especializado nas áreas de Cível Consultiva, Contencioso Estratégico e Recuperação Judicial