{"id":1792,"date":"2019-04-18T11:00:43","date_gmt":"2019-04-18T14:00:43","guid":{"rendered":"https:\/\/wordpress-471455-1551713.cloudwaysapps.com\/?p=931"},"modified":"2020-10-26T11:49:28","modified_gmt":"2020-10-26T14:49:28","slug":"medidas-atipicas-na-execucao-de-quantia-e-o-contempt-of-court-da-efetividade-e-dos-limites-na-sua-aplicacao","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.santosesantana.com.br\/en\/medidas-atipicas-na-execucao-de-quantia-e-o-contempt-of-court-da-efetividade-e-dos-limites-na-sua-aplicacao\/","title":{"rendered":"Medidas at\u00edpicas na execu\u00e7\u00e3o de quantia e o Contempt of Court: da efetividade e dos limites na sua aplica\u00e7\u00e3o"},"content":{"rendered":"
As denominadas medidas at\u00edpicas previstas no inciso IV do artigo 139 do CPC podem ser aplicadas – desde que observados alguns requisitos por parte do julgador – como verdadeiros meios de Contempt of Court.<\/p>\n
Em texto dispon\u00edvel no s\u00edtio eletr\u00f4nico do minist\u00e9rio, o professor Araken de Assis escreveu que s\u00e3o quatro os problemas da execu\u00e7\u00e3o por quantia no Brasil, quais sejam: o reajustamento da presta\u00e7\u00e3o pecuni\u00e1ria; o emprego de meios coercitivos na execu\u00e7\u00e3o; a localiza\u00e7\u00e3o dos bens do executado; e o \u00eaxito da aliena\u00e7\u00e3o coativa\u00b9.<\/p>\n
Na ocasi\u00e3o, concluiu, o professor Araken de Assis que: \u201c(…) \u00c9 preciso que se introduza, entre n\u00f3s, o Contempt of Court. A possibilidade de o juiz decretar a pris\u00e3o do executado, caso ele desobede\u00e7a \u00e0s determina\u00e7\u00f5es judiciais, constitui o meio mais r\u00e1pido e eficiente de assegurar o \u00eaxito do processo executivo. O sucesso da execu\u00e7\u00e3o de alimentos salta \u00e0 vista\u201d.<\/p>\n
Nesta toada, o novo C\u00f3digo de Processo Civil apostou, no inciso IV do artigo 139 <\/a>do C\u00f3digo de Processo Civil, que incumbe ao juiz: \u201cdeterminar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogat\u00f3rias necess\u00e1rias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas a\u00e7\u00f5es que tenham por objeto presta\u00e7\u00e3o pecuni\u00e1ria\u201d.<\/p>\n Entretanto, vale ressaltar a advert\u00eancia realizada pelo professor Fl\u00e1vio Yarshell no sentido de que, tais medidas n\u00e3o s\u00e3o novidade no direito p\u00e1trio, visto que j\u00e1 estavam contempladas no C\u00f3digo de Processo Civil de 1973:<\/p>\n \u201cO emprego de medidas que se enquadram nessa segunda categoria est\u00e1 longe de ser uma novidade no direito positivo brasileiro. Para n\u00e3o falar nas \u201cmedidas de apoio\u201d trazidas pelo \u00a7 5\u00ba do art. 461 <\/a>do CPC\/73 (que encontram correspond\u00eancia nos artigos 297 e 536, \u00a7 1\u00ba do diploma vigente), referentes \u00e0s obriga\u00e7\u00f5es de fazer, n\u00e3o fazer e de entrega de coisa, mesmo nas obriga\u00e7\u00f5es pecuni\u00e1rias a t\u00e9cnica coercitiva ou indutiva j\u00e1 era \u2013 e continua a ser empregada. Assim se verifica nas obriga\u00e7\u00f5es alimentares, mediante a amea\u00e7a de pris\u00e3o, ainda que relativamente limitada. Mesmo como regra geral, a multa de dez por cento (10%) prevista pelo art. 475-J do CPC\/73 e repetida pelo art. 523, \u00a7 1\u00ba do CPC\/15 n\u00e3o deixa de ter aquela fun\u00e7\u00e3o, na medida em que busca estimular o devedor a adimplir. Al\u00e9m disso, ainda na vig\u00eancia do CPC\/73\u00b2.<\/p>\n Sendo assim, a inova\u00e7\u00e3o advinda com o novel diploma processual foi a de possibilitar ao magistrado a aplica\u00e7\u00e3o das referidas medidas at\u00edpicas, \u201cinclusive nas a\u00e7\u00f5es que tenham por objeto presta\u00e7\u00e3o pecuni\u00e1ria\u201d, visto que o c\u00f3digo anterior era silente neste aspecto.<\/p>\n Para Fernando da Fonseca Gajardoni, o supramencionado dispositivo legal consagra ao ju\u00edzo, importante meio para proceder com medidas at\u00edpicas de coer\u00e7\u00e3o. Neste sentido, manifesta-se o autor:<\/p>\n \u201cIlustrativamente, n\u00e3o efetuado o pagamento de d\u00edvida oriunda da aquisi\u00e7\u00e3o de insumos para a produ\u00e7\u00e3o, e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens), seria l\u00edcito o estabelecimento da medida coercitiva\/indutiva de suspens\u00e3o do direito \u00e0 aquisi\u00e7\u00e3o de insumos de novo fornecedor at\u00e9 pagamento do d\u00e9bito; n\u00e3o efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcion\u00e1rios da empresa, poss\u00edvel o estabelecimento de veda\u00e7\u00e3o \u00e0 contrata\u00e7\u00e3o de novos funcion\u00e1rios at\u00e9 que seja saldada a d\u00edvida; n\u00e3o efetuado o pagamento de financiamento banc\u00e1rio na forma e no prazo aven\u00e7ados, poss\u00edvel, at\u00e9 que se tenha a quita\u00e7\u00e3o, que se obstem novos financiamentos, ou mesmo a participa\u00e7\u00e3o do devedor em licita\u00e7\u00f5es (como de ordin\u00e1rio j\u00e1 acontece com pessoas jur\u00eddicas em d\u00e9bito tribut\u00e1rio com o Poder P\u00fablico)\u00b3\u201d<\/p>\n Outrossim, disp\u00f5e o artigo 48, editado pela Escola Nacional de Forma\u00e7\u00e3o e Aperfei\u00e7oamento de Magistrados (ENFAM) o seguinte:<\/p>\n \u201cO art. 139, IV, do CPC\/2015 traduz um poder geral de efetiva\u00e7\u00e3o, permitindo a aplica\u00e7\u00e3o de medidas at\u00edpicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial, inclusive no \u00e2mbito do cumprimento de senten\u00e7a e no processo de execu\u00e7\u00e3o baseado em t\u00edtulos extrajudiciais\u201d.<\/p>\n No Brasil, as t\u00e9cnicas de coer\u00e7\u00e3o nas obriga\u00e7\u00f5es de pagar quantia, denominadas pela doutrina de medidas execut\u00f3rias at\u00edpicas, adotadas pela jurisprud\u00eancia, s\u00e3o a suspens\u00e3o de CNH, o bloqueio de cart\u00f5es de cr\u00e9dito e apreens\u00e3o do passaporte do devedor\u2074.<\/p>\n Thiago Rodovalho, em relevante artigo, assevera que ao aplicar o inciso IV do artigo 139 do C\u00f3digo de Processo Civil, o ju\u00edzo necessita analisar o caso concreto para que n\u00e3o sejam feridos os direitos e garantias fundamentais do cidad\u00e3o.<\/p>\n No que tange a possibilidade de o juiz suspender a CNH do devedor em a\u00e7\u00e3o de execu\u00e7\u00e3o por quantia, assevera o autor:<\/p>\n \u201cCom rela\u00e7\u00e3o \u00e0 suspens\u00e3o da Carteira Nacional de Habilita\u00e7\u00e3o (suspens\u00e3o do direito de dirigir, restri\u00e7\u00e3o de direitos), n\u00e3o nos parece haver qualquer viola\u00e7\u00e3o a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou coloca\u00e7\u00e3o do devedor em situa\u00e7\u00e3o \u00abdesproporcionalmente detrimentosa\u00bb, exce\u00e7\u00e3o feita aos que usam o ve\u00edculo como instrumento de trabalho, atraindo a hip\u00f3tese do NCPC art. 833, inc. V\u201d\u2075 \u2076<\/p>\n No que se refere ao bloqueio de cart\u00f5es de cr\u00e9dito, o aludido autor tamb\u00e9m posiciona-se no sentido de que tal medida n\u00e3o fere os direitos fundamentais do cidad\u00e3o, pois:<\/p>\n \u201co cancelamento dos cart\u00f5es de cr\u00e9dito do executado. Tamb\u00e9m n\u00e3o nos parece haver qualquer viola\u00e7\u00e3o a direito fundamental ou social, nem a direito da personalidade ou coloca\u00e7\u00e3o do devedor em situa\u00e7\u00e3o \u00abdesproporcionalmente detrimentosa\u00bb. Tanto assim o \u00e9, que ser titular de um cart\u00e3o de cr\u00e9dito pressup\u00f5e ter cr\u00e9dito, o que \u00e9 analisado e concedido por institui\u00e7\u00f5es financeiras; mais do que isso, se, porventura, passando por dificuldades financeiras, a pessoa deixa de honrar com pagamentos, a mesma institui\u00e7\u00e3o financeira concedente do cart\u00e3o de cr\u00e9dito pode, sponte pr\u00f3pria, cancel\u00e1-lo ou recusar-lhe a concess\u00e3o. Ora, parece-me contradit\u00f3rio que institui\u00e7\u00f5es financeiras, para sua prote\u00e7\u00e3o patrimonial, possam ferir esse suposto \u201cdireito fundamental\u201d ou esse suposto \u201cdireito da personalidade\u201d, mas n\u00e3o possa o Poder Judici\u00e1rio igualmente faz\u00ea-lo contra aquele devedor moroso que, instado ao pagamento, e frustradas todas as tentativas de constri\u00e7\u00e3o patrimonial, leva vida luxuosa, valendo-se de cart\u00f5es de cr\u00e9dito, que prescindem de dinheiro em conta, \u00e9 dizer, podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrim\u00f4nio\u2077\u201d.<\/p>\n J\u00e1 no que diz respeito \u00e0 possibilidade de apreens\u00e3o do passaporte, o aludido autor entende que deve haver cautela:<\/p>\n \u201c\u00c0 primeira vista, a possibilidade de apreens\u00e3o do passaporte tamb\u00e9m nos parece poss\u00edvel, pois tamb\u00e9m se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial. Assim o \u00e9, pois, salvo situa\u00e7\u00f5es especiais (refugiados, p. ex.), h\u00e1 a necessidade de demonstrar condi\u00e7\u00f5es financeiras, de estadia e retorno para ser admitido no pa\u00eds de destino. Ou seja, pressup\u00f5e uma condi\u00e7\u00e3o financeira que o devedor justamente diz n\u00e3o possuir. Sem embargo dessa considera\u00e7\u00e3o, esse ainda \u00e9 um ponto que merece uma reflex\u00e3o mais acurada, sendo essa apenas uma primeira impress\u00e3o\u201d<\/p>\n Importante notar que, o STJ, corroborando o entendimento do prestigiado autor, entendeu, em um primeiro momento poss\u00edvel a restri\u00e7\u00e3o da CNH do executado, vedada, contudo, a apreens\u00e3o do passaporte, e, posteriormente, adotou posicionamento no sentido de ser deferir a apreens\u00e3o do passaporte do devedor, desde que este n\u00e3o apresente garantia \u00e0 execu\u00e7\u00e3o ou uma alternativa de pagamento do d\u00e9bito\u2078.<\/p>\n Perceba-se, portanto, que a suspens\u00e3o de Carteira Nacional de Habilita\u00e7\u00e3o, apreens\u00e3o de passaporte e bloqueio de cart\u00e3o de cr\u00e9dito, \u00e9 medida poss\u00edvel de ser deferida, desde que se verifique o caso concreto, de modo que os direitos fundamentais, como cedi\u00e7o, n\u00e3o s\u00e3o absolutos\u2079. Deve-se tamb\u00e9m analisar tamb\u00e9m se o executado tomou medidas de boa-f\u00e9 ao longo da marcha processual, tais como: indica\u00e7\u00e3o de bens livres \u00e0 penhora, parcelamento do d\u00e9bito, etc.<\/p>\n Al\u00e9m da an\u00e1lise de suposta viola\u00e7\u00e3o aos direitos e garantias fundamentais do executado, entendemos que o julgador deve verificar aos seguintes requisitos antes do deferimento da medida at\u00edpica: (i) ap\u00f3s o pedido expresso do requerente, faz-se mister que o juiz determine a intima\u00e7\u00e3o da parte contr\u00e1ria para se manifestar, sob pena de violar os artigos 9\u00ba e 10\u00ba, ambos do CPC; (ii) a medida at\u00edpica \u00e9 subsidi\u00e1ria \u00e0 medida t\u00edpica, ou seja, primeiramente deve-se tentar os meios previsto na legisla\u00e7\u00e3o para constri\u00e7\u00e3o patrimonial; (iii) a decis\u00e3o que a aplica deve ser fundamentada nos moldes do artigo 489 do CPC, especialmente no que tange ao par\u00e1grafo segundo do indigitado artigo, que consagra a famigerada \u201cregra da pondera\u00e7\u00e3o\u201d e (iv) deve-se comprovar que o executado esteja praticando atos contr\u00e1rios \u00e0 boa-f\u00e9, como fraudes patrimoniais, bem como desrespeito \u00e0s ordens judiciais\u00b9<\/span>\u2070<\/span>.<\/span><\/p>\n Contudo, imperioso registrar que, as medidas at\u00edpicas n\u00e3o se restringem \u00e0 suspens\u00e3o de carteira de habilita\u00e7\u00e3o, passaporte e constri\u00e7\u00e3o do cart\u00e3o de cr\u00e9dito.<\/p>\n O professor Gilberto Bruschi, em seu manual de recupera\u00e7\u00e3o de cr\u00e9dito, d\u00e1 exemplo de outras pedidos que podem ser intentados pela parte exequente. Veja-se:<\/p>\n Imaginemos, por exemplo, a situa\u00e7\u00e3o de um posto de gasolina que \u00e9 executado. J\u00e1 se tentou todas as medidas previstas em lei e nada foi poss\u00edvel Inclusive o Bacejud e a penhora de receb\u00edveis de cart\u00e3o de cr\u00e9dito para o CNPJ do posto restaram infrut\u00edferas. Poderia se tentar uma medida at\u00edpica de lacra\u00e7\u00e3o, por ordem judicial, de 70% das bombas do posto, at\u00e9 que se efetivasse o pagamento da d\u00edvida, uma vez que o posto est\u00e1 operando normalmente e n\u00e3o \u00e9 encontrado nenhum bem para ser penhorado. Antes de ordenar a lacra\u00e7\u00e3o o juiz intima o executado para manifestar-se sobre o requerimento do credor, no prazo a ser fixado por ele conforme o caso, sob pena de ser deferida a ordem. Provavelmente, para n\u00e3o ver seus ganhos sensivelmente diminu\u00eddos, o devedor tentaria honrar com a d\u00edvida, inclusive podendo requerer uma audi\u00eancia para tentativa de concilia\u00e7\u00e3o com o credor\u00b9<\/span>\u00b9<\/span><\/p>\n A suspens\u00e3o da CNH do executado tamb\u00e9m j\u00e1 foi deferida em importante julgado do TJ-RS, em caso envolvendo dano ambiental praticado requerido, de modo que aquele tribunal entendeu que tal medida guarda razoabilidade e proporcionalidade com a gravidade que demanda o caso concreto. No aludido julgado, o Tribunal ga\u00facho considerou a medida at\u00edpica como verdadeiro Contempt of Court\u00b9<\/span>\u00b2<\/span>.<\/span><\/p>\n Desta feita, da mesma forma que n\u00e3o seria razo\u00e1vel o requerimento destas medidas de maneira gen\u00e9rica pelo credor, sem visar a sua efetividade, tamb\u00e9m n\u00e3o seria cr\u00edvel o indeferimento das medidas at\u00edpicas, ante as condutas desleais, recalcitrantes, e em clara desobedi\u00eancia \u00e0s ordens judiciais, mormente no que se refere a danos coletivos, onde toda a sociedade pode ser prejudicada.<\/p>\n Diante de todo o exposto, entendemos que as denominadas medidas at\u00edpicas previstas no inciso IV do artigo 139 do CPC podem ser aplicadas – desde que observados alguns requisitos por parte do julgador – como verdadeiros meios de Contempt of Court, levando-se em conta n\u00e3o apenas o interesse do credor, mas tamb\u00e9m a efetividade do processo e o respeito \u00e0s decis\u00f5es judiciais.<\/p>\n ___________<\/p>\n 1<\/b> A \u00edntegra do texto por ser lida aqui<\/a><\/p>\n